Os Estados Unidos <br> e o golpe no Egipto

Carlos Lopes Pereira

A CIA reconheceu pela primeira vez a sua participação, juntamente com os serviços secretos britânicos, no golpe de estado militar no Irão, em Agosto de 1953.

O movimento golpista derrubou o então primeiro-ministro progressista Mohamed Mossadeg – que «desafiara» os Estados Unidos e a Grã-Bretanha ao defender a nacionalização da indústria petrolífera persa – e devolveu o poder absoluto ao xá Reza Pahlevi.

Documentos secretos desclassificados em 2011, mas só agora revelados em Washington, explicam que a acção militar contra Mossadeg e o seu governo de frente nacional foi dirigida pela CIA «como um acto de política externa norte-americana».

Os círculos anti-imperialistas em todo o mundo denunciaram ao longo de décadas a conivência norte-americana nesse golpe no Irão. Nesse e em dezenas de outros golpes e assassinatos cometidos contra regimes e personalidades progressistas na Ásia, na América Latina e em África.

Não será necessário esperar mais 60 anos até se comprovar a cumplicidade dos Estados Unidos no golpe de estado militar do passado 3 de Julho no Egipto. Ali, as forças armadas, lideradas pelo general Abdel Fatah al-Sisi, derrubaram o presidente eleito Mohamed Mursi, reprimiram brutalmente os apoiantes encabeçados pela confraria dos Irmãos Muçulmanos, prenderam os seus chefes e impuseram o estado de emergência no país.

A reacção do Ocidente ao golpe militar no Egipto limitou-se às palavras.

O presidente Barack Obama garantiu com hipocrisia que «não toma partido» entre os dois lados do conflito. O seu secretário da defesa, Chuck Hagel, prometeu trabalhar para «pôr fim à violência e facilitar a reconciliação». E dirigentes da União Europeia condenaram o «excesso de força» e pediram «contenção», «respeito pelos direitos humanos» e «diálogo».

Mas, para além das cínicas declarações dos dirigentes dos Estados Unidos e dos seus aliados europeus, e de uma ou outra medida sem impacto – como o cancelamento de manobras militares conjuntas entre norte-americanos e egípcios – há os factos.


Aliado comprador

E os factos mostram que, depois do tratado de paz com Israel, em 1979, o Egipto é um país fundamental para os interesses imperiais dos Estados Unidos e para a sua estratégia de dominação no Médio Oriente.

O Cairo é o segundo maior destinatário da «ajuda» bilateral económica e militar norte-americana, logo depois de Telavive, tendo recebido em 2012 cerca de 1500 milhões de dólares, a maior parte (1300 milhões) destinada a «assistência» bélica.

Segundo o jornal espanhol «El País», a «ajuda» militar estado-unidense ao Egipto inclui a formação de oficiais (500 a 1000 por ano) nas academias dos EUA. No ano passado, cerca de 80 por cento do armamento do ministério da defesa egípcio foi adquirido aos Estados Unidos. Em 2010 o Egipto encomendou 20 aviões F-16 à empresa Lockeed Martin, por 2500 milhões de dólares, e, em 2013, vai comprar 1 200 tanques M1A1 Abrams Battle à empresa General Dynamics.

Também no quadro desta dependência militar – as forças armadas egípcias são financiadas, armadas e treinadas pelos Estados Unidos –, o governo do Cairo autoriza porta-aviões e outros navios da marinha de guerra norte-americana a atravessar o Canal de Suez entre o Mediterrâneo e o Golfo Pérsico. E permite, claro, que os petroleiros cruzem o Mar Vermelho: em 2012 passaram o Suez 3600 petroleiros, transportando três milhões de barris de crude, um comércio vital para os Estados Unidos.

Um outro aspecto da vergonhosa submissão política e militar do Cairo em relação a Washington é o papel que o Egipto desempenha, desde os acordos de Camp David, no policiamento da Península do Sinai, contribuindo para o bloqueio da Faixa de Gaza e para a «segurança» de Israel na sua guerra de agressão e anexação contra o povo palestino e outros povos árabes da região.

Por todas estas razões, é cada vez mais evidente que, no complexo processo em curso no Egipto, repleto de contradições, os Estados Unidos estão a apostar fortemente no reforço do domínio daquele país norte-africano – ontem com o governo islâmico de Mursi, hoje com os militares de al-Sisi. E, em caso de necessidade, a «solução» que o imperialismo encontrou para a vizinha Líbia pode ser repetida no Egipto…

Um indicador claro da participação norte-americana no golpe de 3 de Julho é a entrada em cena da Arábia Saudita, dos Emirados Árabes Unidos e do Kuweit, fiéis aliados dos Estados Unidos. Inimigos dos Irmãos Muçulmanos, apoiam a ditadura militar do Cairo e desbloquearam já 9000 milhões de dólares de ajuda económica ao Egipto...



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